30 de setembro de 2010

#marcozero

Quando se inicia uma viagem? No momento em que se decide partir? Na compra das passages? Ao planejar uma estadia? Na hora em que se chega ao destino desejado?


Para cada pessoa essas são as alternativas, para mim foi no dia em que decidi sair de Jaraguá e iniciar a mais longa delas: a viagem em busca de outra sorte. Há cinco anos, em uma segunda-feira qualquer de fevereiro, uma fina chuva encobria Jaraguá do Sul e eu partia da cidade rumo à Florianópolis.





Ontem, a mesma chuva veio ter comigo novamente, deixando a Ilha totalmente acinzentada. Porém desta vez ela ficou surpresa ao ver que meu meio de locomoção habitual não foi o escolhido. Eu partia dentro de um automóvel muito maior. Uma monstruosidade moderna. Um objeto capaz de pesar tanto quanto uma casa e mesmo assim voar.

A sorte que enfim eu encontrei após 5 anos de buscas incessantes e por vezes cansativas mostrou seu rosto por trás da garoa. Ela está envergonhada e gagueja quando tem que falar firme. Mas isso não importa. O importante é que ela está aqui e me encontrou finalmente.

P.S.: chuvisca em Stuttgart enquanto escrevo.

12 de setembro de 2010

#Resumo.


Quatrocentas palavras. Quatro centos de vocábulos agrupados sob a égide duma frígida fronteira ocular latitudinal. Uma caixa de diálogo retangular, de quatro lados, quatro vértices e duas únicas direções multifacetadas: a de quem lê e a do que é lido. Quatrocentas palavras, rezava a cartilha e eu nem sabia por onde começar. Um “era uma vez”, quem sabe, se o ensejo não reclamasse cerimônias. Não, não era uma vez. Eram quatrocentas, no mínimo quatrocentas vezes. Outras cem atingiriam o ápice, mas quatrocentas era o exigido. Começo com o artigo definido masculino. Como posso, entretanto, começar definindo o mundo se eu nem tenha ideia do que seja, aliás nem sei como começar, menos ainda imagino como vai acabar? Declino. O artigo definido definitivamente é restringido! Devo usar nomes nus. Aliás, nome nu, no singular. Nomes de massa também se fazem presentes e seria indigno olvidar deles! Mas eu não quero falar deles, na verdade. Eles me cansam, cansam minha beleza, me sugam o tempo. Eu tinha que ir. Precisava seguir mas há algo mais forte aqui que me impede. Vou embora!, digo a mim mesmo, ao que me respondo Não posso! Estou esperando ela. Ela nunca vinha, era fato, mas eu me comprometera e deveria esperá-la, aliás, por que não esperá-la? Não tenho mais nada a fazer, mesmo. Por que então não esperar ela? Não é que eu não fosse esperar, mas é que esperar me cansa. E eu não posso me cansar. Eu tenho que enfrentar quatrocentas palavras, agora. Mas quatrocentas são poucas, na verdade. Dizem que conseguimos armazenar quarenta mil. Quatrocentas são, então, dez por cento de quarenta mil. Mas eu não me entregaria às quarenta mil. Quatrocentas já estão de bom tamanho. Pois é. Tentei fugir das quatrocentas, mas não consegui também. Acredito que preciso inscrever a minha covardia não mais com quatrocentas, mas com mil e quinhentas, pelo menos, que é pra ver se eu me curo do trauma. Dizem que isso é possível: curar-se dos traumas através da linguagem. Eu não acredito. Na verdade eu não sei se acredito. Mas eu escrevo. E toda vez que eu escrevo e me livro de algum trauma, parece que começa a chover traumas sob minhas costas. E eles pesam... Prefiro não mexer nos traumas. Posso deixá-los ali no cantinho? De escanteio? Só faltam quinze palavras, agora. Talvez menos, dez, nove, o que eu não queria era falar de solidão.

por MARIANO, R. S.

3 de setembro de 2010

#agonias


Ode à “Mentiras” de Adriana Calcanhoto



Nada ficou no lugar...

E eu escarrada no colchão
a esperar o teu “bom dia”
que, como de costume, não viria.

Eu vou escrever no seu muro
as lamentações da mulher usada,
as amarguras da amante abandonada,
a dor de quem no coração leva um murro.

Nada ficou no lugar...

Novamente estou eu sem chão, sem teto.
Sou as sobras refeitas da falta de afeto.
Não preciso mais deste furacão de emoções,
No ar me comprimo e no fogo busco as razões.

Eu vou publicar os seus segredos,
Quero acabar com sua alegria. Vomitar em seu dia.
Mas assim que anoiteço, me perco de novo
Em suas mãos enlouqueço, e me esqueço ..
[me esqueço
Nada ficou no lugar...]



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