25 de agosto de 2011

#regresso

Um botão de rosa no saguão lotado. Bocas apreensivas perguntavam – cadê ela? Será que era esse o voo certo? As xícaras na mesa. O lugar vago a esperar pela menina que se fora. Os olhos da vovozinha de cabelos pintados estavam marejados de angústia, por conta de uma ausência que seria hoje finalmente preenchida. Eu voltei.

Foram dez meses fora. Out total da realidade de um país mergulhado em um problema funcional tão grande, que o único sentimento que restou no povo foi o de “não tem mais jeito”. As conversas de como fora minha “vida lá fora” se resumiam a uma triste constatação: estamos longe, muito longe, do caminho certo. Não digo que sinto a mesma coisa, que acho que nosso país está perdido e fadado a lama. Vivi muito bem na Alemanha. Tudo funcionava corretamente aos meus olhos. Mas não se pode comparar a rotina de um convidado na sua casa com a sua, por exemplo. O país também luta contra problemas internos, só que diferentes dos nossos. A cada testemunho, deixo meu recado de conforto dizendo “dá sim pra melhorar, se eles podem ser assim, nós também podemos”. A solução está na educação.

Foram muitos os abraços apertados, as quase lágrimas de reencontro, os sorrisos saudosos. Revi amigos, parentes e até conhecidos que há anos não encontrava. Momentos que duraram minutos, outros de horas. Muitos reencontros já me cansam. É tanta novidade para colocar a par, que minhas forças andam se esvaindo. Ou talvez seja o fuso horário que meu corpo ainda não absorveu. As fofocas rolam soltas, as risadas mais ainda. É tão bom sentir-se amada e querida novamente, principalmente pelas pessoas especiais na nossa vida. No fim, é sempre a família o nosso porto seguro, por mais clichê e démodé que pregar isso possa parecer.


Retornar, regressar, reviver, rever. Tudo que tenho agora que fazer. Em certos aspectos é triste observar como certas pessoas e lugares continuam os mesmos. Se não há nada de novo, será que eu também não mudei? Será que morar em outro país não me transformou nem um pouquinho? Acredito que não. Toda experiência vivida acrescenta algo em nossa vida. O conhecimento não ocupa espaço e todos somos substituíveis, por mais únicos que nos sintamos ou de fato somos. É estranho olhar seu lugar ocupado por outro, mas como cíclica que a vida é, assim tem de ser. Saímos, construímos, e desapegar-se do que passou faz parte do processo. Cortar o cordão dói, mas descobrir que não se evolui dói muito mais.

Sei que em mim o calor do verão europeu ainda não esfriou. Porém o lugar à mesa está novamente ocupado. Casa: aqui me tens de regresso.

24 de agosto de 2011

#parti

Três malas abertas pelo chão. Várias necessaires espallhadas pela cômoda aguardando o momento final. Sacos e mais sacos de lixo e roupas para doar. Assim está meu quarto enquanto escrevo esse texto. Há um prazer em não se fechar as malas que só quem viaja compreende. Prolongamos a despedida até o último momento possível, queremos eternizá-la. E assim como quando deixei Florianópolis, chove copiosamente agora em Weingarten. Até enchente vi aqui, pela primeira vez.  As últimas fotos da cidadezinha, que eu faria antes de ir, não acontecerão mais, já fotografei com chuva e a experiência não foi das melhores. Prefiro manter as imagens da pequena e ensolarada cidade, que tão calorosamente me acolheu nos último dez meses, secas.


Estou a escutando agora “Os segundos”, da banda Cidadão Quem. Ele diz “Foi pouco tempo, mas valeu, vivi cada segundo..”. Essa frase é a mais clichê e mais honesta que poderia existir nesse momento. Você mesmo acompanhou aqui, por um curto espaço de tempo, um pouquinho da minha vida na Alemanha. Claro que faltou falar sobre muitas coisas, aspectos, acontecimentos, mas não me arrependo de ter levado adiante o convite da querida Camila. Tentei ser o mais fiel possível em meus textos sobre como eu via o que me cercava. Mas, sem choramingos, o momento agora é de alegria. Alegria em rever a casa da mãe, os amigos, as colegas, apesar de que é uma alegria triste, pois ela é acompanhada da dor de deixar para trás os novos amigos e as novas colegas.

Visitei alguns países além da Alemanha, vi quadros, castelos e praças que nunca imaginei um dia chegar perto. Elas existiam apenas nos meus livros e pesquisas. Eu já poderia morrer e dizer que realizei boa parte dos meus sonhos, certo? Errado. Há muito mais para ver nesse mundo do que nossos desejos todos juntos um dia idealizarão. Então, se com minhas palavras pouco refinadas, eu consegui de alguma maneira trazer para vocês esse gostinho, já me sinto realizada.

Parti.

14 de agosto de 2011

#feliz?



hoje é o dia em que a televisão se infesta de gente falando do pai herói, do pai que já se foi ou do pai que acabou de se transformar em. os colunistas contam suas histórias com seus pais pelos jornais de todo país. 
mas em alguns cantos do brasil, em uma casa de madeira, noutra de concreto sem pintura, um "pai" bêbado bate em um filho que o juro de morte em silêncio. outro "pai" abusa da filha indefesa que nunca mais irá amar uma pessoa da mesma maneira. esses homens, indignos de serem chamados de "pai", aquele tal que deveria ser protetor e amoroso,  que está nas vidas de muitos desde a tenra idade, aproveitam de seu papel de comando para torturar e assediar moralmente os frutos do que deveria ser uma união de bom afeto. 
para esses homens eu não desejo um dia feliz. eu desejo o fim da dor e da intolerância, dos mals tratos e das injustiças, para então esse domingo de agosto poder ser comemorado de fato.

13 de agosto de 2011

#berlim

Sabe quando você se sente fazendo parte do mundo? Eu vi a vida acontecer por quatro dias diante dos meus olhos. Viajei para Berlim.

Não tem como não se apaixonar por Berlim. Muito parecida com Londres e um pouco de Amsterdam, por conta dos trens, metrôs normais e de superfície, gente do mundo inteiro, falando várias línguas, museus, memoriais, esculturas em lugares inesperados e feiras das mais diversas. A pior parte? Ter que voltar para casa.

Berlim é uma atração completa. Não só por ter o parlamento e toda a parte político-burocrática da Alemanha, como ministérios e consulados, mas por conter em seus espaços a história viva desse país europeu. A cada marco, memorial, um pedaço de uma história recheada de guerras, conflitos e muito sofrimento popular é contada. Mas também exibem muita força e união que tiveram os alemães para se reerguerem das cinzas e dos escombros.

Só Berlim sozinha (pois existe um perímetro chamado grande Berlim) tem 3,4 milhões de habitantes, das mais variadas nacionalidades. Penso que somados aos turistas, tenha mais alguns mils. Cafés simpáticos, gente perdida com mapa nas mãos, artistas de rua tentando ganhar o seu, trânsito caótico em dia de chuva, e mais tantos elementos que juntos montam o perfil de uma grande cidade estão por toda parte.


Fiquei muito emocionada em vários momentos e não teve jeito de conter as lágrimas ao ver fotos e documentações sobre a segunda guerra mundial. Logo depois que se cruza o portão de Brandemburgo (esse da foto), caminhando à esquerda, se chega ao memorial em homenagem aos judeus assassinados por toda a europa. Os dados são arrepiantes. Os números estarrecedores. Até na Grécia morreram judeus vítimas do nazismo. A cada depoimento de um sobrevivente meus olhos se inundavam e eu me perguntava: como é que isso pôde um dia acontecer? Pior, como ainda acontecem atrocidades pelo mundo e não fazemos nada a respeito! Em outro memorial eles agradeciam aos heróis silenciosos. Os alemães que ajudaram a manter vivos e escondidos judeus por toda Alemanha durante o longo período das trevas. Até mesmo a lista de Schindler está lá.

Por praticamente toda a cidade há marcas no chão por onde passava o muro de Berlim, que dividiu por 28 anos a Alemanha entre capitalistas e socialistas.  Hoje, 13 de agosto, (não)se comemora os 50 anos da construção do muro, que felizmente já não tem mais o mesmo papel. Muitas foram as pessoas assassinadas por tentarem cruzar a divisirória e ir para o outro lado. Em um dos memoriais do muro (o mais oficial) eles mostram com fotos como foi que deu-se naquele bairro a passagem do blocão de concreto, dividindo um cemitério ao meio! Pode-se subir em uma torre e visualizar com bastante clareza as marcas da imbecilidade humana. Eu diria que o muro, hoje, é uma grande instalação artística, permeando vários pontos da Berlim turística. Uma obra de arte fundada nos anos de guerra fria e do terror de ter que ser isso ou aquilo por conta de onde você morava e dos políticos que comandavam sua região.

Berlim é isso. Arte moderna nas galerias, pinturas do passado nos museus, e memoriais que não deixam ninguém esquecer, seja turista do mundo, seja turista alemão, o que foi esse país um dia. Uma gente misturada, de todas as cores  e estilos. Construções grandiosas e imponentes exibem uma potência que na verdade ainda tenta compreender porquê o machucado resiste em não sarar.

11 de agosto de 2011

#será?

você me diz que faço falta
que a casa sem mim não é a mesma
mas o outro em meu lugar já apareceu
e de nada adianta você agora chorar,
ou  me pedir pra voltar 
dizendo
meu amor, eu me arrependi
você me matou.
destruiu o meu ser por completo
não me peça para regressar
a cola ainda é recente e há de secar.




mei

9 de agosto de 2011

#abraço


se despediam com a incerteza de que um dia iriam se reencontrar.
se abraçaram com tanta intensidade que o namorado dela desconfiava de algum sentimento.]
algum sentimento pendente entre aqueles dois.
algum sentimento espremido na força daqueles corpos.
foram apenas algumas semanas de convívio, risadas e noites no bar.
um companheirismo que não se acha vagando pela rua.
e agora estavam ali se entreolhando uma última vez antes de cada um retornar.
retornar ao antes daquele primeiro encontro.
retornar à uma vida antes de ter descoberto o significado do impossível.
promessas sobre uma nova viagem em conjunto foram feitas.
mas o tempo, senhor de barbas brancas que já viu de tudo passar, 
sabe que são só mais dois apaixonados separados por um oceano e que nunca juntos irão ficar. 


mei.

8 de agosto de 2011

#você



Nos encontramos ontem na escada
Você de terno, eu de tênis
Minhas unhas mal pintadas me deixavam nervosa
Você estava cansado do trabalho
Mas eu sabia que aquele encontro não era acaso.
Era sorte.
Eu tirei uma foto mental sua, para depois.
Eu vivo sempre no depois, nos sonhos.
Meus amores acontecem sós.
Nos meus pensamentos eles sempre dão certo.
Não há brigas, nem discussões.
Somos sempre felizes e nos amamos muito.
Mas a cada dia que eu me acordo só
Penso que poderia ter dito algo naquele momento
São sempre segundos entre nós dois.
Segundos congelados no eterno.
Eu sou capaz de te amar com toda a força do meu corpo
Sem que você saiba.
Quer dizer, na minha mente você sabe.
E me ama também.
E somos felizes.
E somos sós.
Eu e você que não existe...

Mei.

7 de agosto de 2011

#que-beleza

Eu já disse algumas vezes que moro no sul da Alemanha né? Precisamente no estado federativo de Baden-Württemberg. Pois bem, isso faz toda a diferença quando o assunto é moda. Gente, as pessoas se vestem de maneira extremamente peculiar aqui. Especialmente em Weingarten, cidade com pouco mais de 30 mil habitantes.

Com certeza você reconhece um turista alemão facilmente no Brasil. Roupas tom pastel, pochete, chapeuzinho e alguma sandália de caminhada. Se calhar, usando a sandália com meias!!! Aqui também há essa classe, mas ela não é a dominante. Não que eu esteja fazendo julgamento de valores, quer dizer, estou, não queria dizer na lata, mas as pessoas se vestem de forma tão confortável aqui que a gente até releva a feiura das roupas e conjuntos.

Eu não sou nenhuma Glorinha Kalil ou adjacentes, nem fashionista ou seja lá o termo das entendidas de moda, mas tem horas andando na rua que sou tomada por um sentimento de vergonha alheia fora de série.


O alemão daqui é bem parecido com aquelas pessoas de fotos dos anos oitenta sabe? Jaqueta jeans, calça alta (sempre), cortes de cabelo estilo “mulets” e tudo isso muitas vezes combinando um verde limão com pink, ou uma saia longa vermelha com blusa amarela. Uma graça de se ver passar. Mas é claro que essa escolha por cores berrantes tem um sentido muito especial. Foram anos de vida na miséria entre e durante guerras. O consumismo entrou por um lado e foi combatido por outro durante a separação entre Alemanha capitalista versus socialista. Por isso as pessoas falam através do que vestem. Das recatadas às extravagantes, passando pelas jecas. Não se importam como que você está pensando sobre a aparência delas. Boa parte das pessoas em geral aqui são assim, e isso é um ponto bem positivo. Ninguém é escaneado de ponta a ponta quando chega usando alguma combinação extravagante nos lugares. Ou muito menos julgado “mal vestido” nas festas e baladas.

Evidentemente que isso eu presencio na cidade pequena. Das vezes que fui à Munique (a cidade da Oktoberfest oficial), no estado vizinho, me senti até deslocada pela elegância em um ou dois lugares que frequentei. Mas acham que alguém notou ou me mandou algum olhar de julgamento? Necas de pitibiribas! Nada. Zero! Na minha cabeça a voz da minha avó dizendo “não acredito que saísse de casa com essa roupa” e ao meu redor gente querendo se divertir sem dar a mínima para o que os outros pensam sobre como eles se vestem.

Aqui, parece que quanto mais exêntrico melhor. Tenho certeza que isso ainda é reflexo do militarismo que fez o país ser apenas preto e branco durante anos. Por isso as pessoas mais velhas escolhem sempre um tom só de roupa, em contraste às mais novas.
Os jovens se vestem de forma bem parecida. Acho que todos saíram de um catálogo da H&M. Tem ainda a maneira diferente como os jovens turcos se vestem. As meninas pesam na maquiagem e penteados marcados pelo uso de laquê. Já os meninos parecem mini-mafiosos, para deixar bem claro a origem que têm.

É difícil em uma só vez falar sobre tantas vertentes diferentes de moda que há nesse país. Mas uma coisa é certa e precisa ser dita: o valor das roupas aqui é irrisório. Sim, existem as lojas de marcas famosas e caras, mas as de departamento fazem liquidações constantemente e é difícil conter-se diante das promoções. E apesar de baratas, as roupas são de qualidades boas até. Por isso você não dinstingue a profissão de alguém, nem o nível social através do que a pessoa está vestindo. E se isso não é fantástico, não sei o que mais pode ser!